O Tambor sacrílego e o Tambor
sagrado.
Como dizia Nietzsche no livro "Assim Falava Zaratustra": "Eu só poderia crer em um Deus que soubesse dançar".
Como dizia Nietzsche no livro "Assim Falava Zaratustra": "Eu só poderia crer em um Deus que soubesse dançar".
Introdução.
Existem muitos julgamentos e diferentes apreciações em
relação ao tambor (com este nome na realidade estou incluindo a percussão na
sua totalidade: bateria, tumbadoras, atabaques, etc). Olha-se para ele apenas como
algo que produz um som estridente, se o associa ao barulho, ao ruído; mas
também existe quem o aprecie pelo viés da pluralidade tímbrica dos seus
múltiplos sons e o veja associado ao ritmo, ao lado cadencioso e lúdico da base
musical.
Para os músicos, os tambores representam uma alternativa necessária
na instrumentação de alguns estilos, podemos citar o caso do Jazz-fusion, da
música latina, brasileira ou uruguaia, por exemplo, onde normalmente se usam
vários percussionistas e bateria numa mesma formação instrumental ou, como
acontece na música clássica e na contemporânea, onde se incorporam vários
percussionistas numa peça para engrandecer o colorido e para introduzir diferentes
combinações tímbricas das que encontramos nas instrumentações dos grupos de
câmera habituais.
Para alguns o tambor é coisa de amador, um instrumento menor
ou secundário, como ele não toca em alturas determinadas e como normalmente não
se escrevem partitura para ele, se o pensa em um papel coadjuvante. – disso dá
exemplo o fato de na “Ordem dos músicos do Brasil”, para se avaliar quanto à
remuneração econômica, existe uma tabela para músicos e outra para ritmistas.
Estas tendências
geram avaliações, e do ponto de vista de um julgamento simbólico, olha-se o
tambor, por um lado, como algo sacrílego ou maldito e em outras situações , ao contrario, como algo ligado ao sagrado
ancestral, como um som abençoado .
Os mitos.
A história vem de muito longe, assim como na tradição grega se
conta que o deus Hermes furtou de seu
irmão Apolo cinqüenta vacas para criar a lira e criar todos os sons ,como diz
Chico Buaque na letra da música “Choro bandido”, dentro da tradição babilônica temos um mito
para contar a criação do tambor.
Trata-se do primeiro romance da historia, onde se conta o
relato chamado da “Epopéia de Gilgamesh” (1), são poemas sumerianos (da antiga
mesopotâmia) que narram os feitos do famoso Gilgamesh que viveu na primeira
metade do terceiro milênio antes de Cristo.
(
Essa obra narra como da primeira arvore que existiu na terra se construiu um tambor e
uma baqueta que receberam o nome de
Pukku e Mukku.
“Dos galhos, da coroa da árvore de Hulupu, Iranna fez um
tambor para Gilgamesh “
O herói de Uruk”.
No terceiro texto, o tambor e a baqueta, por alguma razão caem
no abismo, chamado de inferno (2), o
Tambor sagrado e a baqueta sagrada não
podem ser resgatados por Enkidu que
mergulha para buscá-los. Ele não conseguiu resgatá-los e nem sair do inferno porque
ninguém sai da terra dos mortos com vida mais o deus Enki pratica um buraco no
chão e permite que a sombra do Eikidu conte para Gilgamesh a triste situação
dos que ficaram embaixo. O tambor e a baqueta não foram resgatados.
A percussão nas culturas.
Compressão sagrada da percussão.
Depois de conhecer esta perspectiva mítica do tambor podemos inferir alguns conceitos, primeiro o caráter sagrado dos instrumentos; no Candomblé (3) , por exemplo, são consagrados, eles recebem uma benção e só podem ser tocados pelos Ogans (4). No Candomblé de Cuba, conhecido como Santeria, os instrumentos além de serem consagrados são feitos por encomenda e destinados a um único tocador daquele tambor.
Temos no Candomblé brasileiro uma instrumentação de percussão : o agogô, o xereré, e trés tambores (atabaques) que recebem o nome de rum, rumpi e o lê.
Dentro da mesma cultura em Cuba, este tambores tem outra forma, os tambores bata, também são três, recebem o nome de : o ijá , itótele e okónkolo.
Em esta tradição o tambor se comunica a partir dos músicos com a divindade, no caso com os Orixas , que representam as forças da natureza.
Falamos da compressão respeitosa que se tem da percussão na cultura na Grécia, na Pérsia antiga, na cultura africana; nas cultura orientais, no budismo inclusive, o som do sino é considerado sagrado. O nome de estes sinos é Bonshō (梵鐘 Sinos budistas), também conhecidos como tsurigane (釣り鐘 Sinos pendentes) ou ōgane (大鐘 Grandes sinos)são sinos de grande dimensão que se encontram nos templos budistas budistas no Japão, utilizados para chamar os monges para a oração, e para marcar períodos de tempo.
Na Índia a instrumentação percussiva é muito ampla, temos as tablas, pakhawaj, dholak da família de instrumentos com pele, ainda existem cascaveles conhecidos como gunguru e pequenos címbalos chamados de Crotal .
Na Índia assim como no Japão o tambor era considerado um instrumento relacionado com a religião.
O Deus Lingo era considerado o primeiro músico e Ganesha o Deus do som.
Existem instrumentos de percussão encontrados em escavações que datam de 3000 Ac.
Existiram timbales conhecidos com o nome de dumdubhi utilizados nas cerimônias religiosas para cantar aos deuses e na guerra como uma especie de talismã. (5)
Nas populações indígenas no Brasil embora exita uma diversidade que nos impede falar delas com um todo, ainda assim podemos encontrar algumas similitudes que nos permitiriam afirmar que a maioria dos povos indígenas associa a música com o universo transcendente e mágico , isto tem seu origem nos mitos fundadores.
Um desses mitos fala que a música foi um presente do deuses, existiria uma música original que habita no mundo dos sonhos, do mundo ancestral evocada pelos sacerdotes e que são socializadas em festividades grupais sendo um elemento fundamental na construção do que chamaríamos em ocidente de cultura.
O canto, a percussão fazem parte de esta experiencia sonora que é predominantemente coletiva.
Compreensão profana da percussão.
Em oposição ao lado sagrado temos o lado sacrílego do tambor: o cristianismo considerou a partir de alguns parâmetros estéticos excludentes, que alguns choques harmônicos nas vozes dos corais e que os timbres que resultavam dos instrumentos de percussão seriam considerados indesejáveis.
A instrumentação percussiva referida na tradição na bíblia, no antigo testamento não menciona a palavra tambor mas usa a palavra pandeiro, a tradição cristã desde David privilegiou o canto coral (6), a percussão se restringia a pandeiros e címbalos se considerando aos tambores mais relacionados com rituais pagãos, isto criou um estigma em torno a percussão e esta passou a ser associada com algo pouco propicio para entrar nos lugares sagrados.
O que vemos na realidade é que o lado rítmico, não só o do som, mas o lado ligado ao que poderia provocar um movimento, dança, algo lúdico também foi banido se o associando ao lado pagão do fazer musical.
Outros desdobramentos que afetam a percussão.
Falamos do sagrado , profano, do lado rítmico associado ao tema, agora vamos observar o que acontece pelo lado estritamente racional-musical , podemos constatar no dia a dia o preconceito que existe no imaginário social , no senso comum, e inclusive em alguns músicos e ouvintes ao se referir a percussão como uma sonoridade menor, isto resultado de uma avaliação que esta associada com o menospreço que se tem com todo o ligado ao fato de que a percussão não define alturas reconhecidas dentro do sistema tonal mas mais que nada por que a percussão esta associada ao lado intuitivo e irracional em oposição ao saber "culto" ou acadêmico.
Demorou muito, por exemplo, para que seja incorporado no curriculum das academias o ensino de percussão, para sejam publicados métodos, transcrições para que o saber oral seja colocado na pauta.
A percussão ligada com a música de concerto sim mas o estudo da percussão popular e da bateria ainda não tem espaço para um estudo mais aprofundado a nível universitário em países como o Brasil.
Este desprezo envolve também uma aversão com todo o associado com a cultura negra, decorrente inclusive de uma ideia de superioridade racial ligada com o status social e também , em este caso, com aquilo que remete ao sentimento e ao corporal. sempre inserido e latente no conceito do que significa percutir bater, tocar,
Depois de conhecer esta perspectiva mítica do tambor podemos inferir alguns conceitos, primeiro o caráter sagrado dos instrumentos; no Candomblé (3) , por exemplo, são consagrados, eles recebem uma benção e só podem ser tocados pelos Ogans (4). No Candomblé de Cuba, conhecido como Santeria, os instrumentos além de serem consagrados são feitos por encomenda e destinados a um único tocador daquele tambor.
Temos no Candomblé brasileiro uma instrumentação de percussão : o agogô, o xereré, e trés tambores (atabaques) que recebem o nome de rum, rumpi e o lê.
Dentro da mesma cultura em Cuba, este tambores tem outra forma, os tambores bata, também são três, recebem o nome de : o ijá , itótele e okónkolo.
Em esta tradição o tambor se comunica a partir dos músicos com a divindade, no caso com os Orixas , que representam as forças da natureza.
Falamos da compressão respeitosa que se tem da percussão na cultura na Grécia, na Pérsia antiga, na cultura africana; nas cultura orientais, no budismo inclusive, o som do sino é considerado sagrado. O nome de estes sinos é Bonshō (梵鐘 Sinos budistas), também conhecidos como tsurigane (釣り鐘 Sinos pendentes) ou ōgane (大鐘 Grandes sinos)são sinos de grande dimensão que se encontram nos templos budistas budistas no Japão, utilizados para chamar os monges para a oração, e para marcar períodos de tempo.
Na Índia a instrumentação percussiva é muito ampla, temos as tablas, pakhawaj, dholak da família de instrumentos com pele, ainda existem cascaveles conhecidos como gunguru e pequenos címbalos chamados de Crotal .
Na Índia assim como no Japão o tambor era considerado um instrumento relacionado com a religião.
O Deus Lingo era considerado o primeiro músico e Ganesha o Deus do som.
Existem instrumentos de percussão encontrados em escavações que datam de 3000 Ac.
Existiram timbales conhecidos com o nome de dumdubhi utilizados nas cerimônias religiosas para cantar aos deuses e na guerra como uma especie de talismã. (5)
Nas populações indígenas no Brasil embora exita uma diversidade que nos impede falar delas com um todo, ainda assim podemos encontrar algumas similitudes que nos permitiriam afirmar que a maioria dos povos indígenas associa a música com o universo transcendente e mágico , isto tem seu origem nos mitos fundadores.
Um desses mitos fala que a música foi um presente do deuses, existiria uma música original que habita no mundo dos sonhos, do mundo ancestral evocada pelos sacerdotes e que são socializadas em festividades grupais sendo um elemento fundamental na construção do que chamaríamos em ocidente de cultura.
O canto, a percussão fazem parte de esta experiencia sonora que é predominantemente coletiva.
Compreensão profana da percussão.
Em oposição ao lado sagrado temos o lado sacrílego do tambor: o cristianismo considerou a partir de alguns parâmetros estéticos excludentes, que alguns choques harmônicos nas vozes dos corais e que os timbres que resultavam dos instrumentos de percussão seriam considerados indesejáveis.
A instrumentação percussiva referida na tradição na bíblia, no antigo testamento não menciona a palavra tambor mas usa a palavra pandeiro, a tradição cristã desde David privilegiou o canto coral (6), a percussão se restringia a pandeiros e címbalos se considerando aos tambores mais relacionados com rituais pagãos, isto criou um estigma em torno a percussão e esta passou a ser associada com algo pouco propicio para entrar nos lugares sagrados.
O que vemos na realidade é que o lado rítmico, não só o do som, mas o lado ligado ao que poderia provocar um movimento, dança, algo lúdico também foi banido se o associando ao lado pagão do fazer musical.
Outros desdobramentos que afetam a percussão.
Falamos do sagrado , profano, do lado rítmico associado ao tema, agora vamos observar o que acontece pelo lado estritamente racional-musical , podemos constatar no dia a dia o preconceito que existe no imaginário social , no senso comum, e inclusive em alguns músicos e ouvintes ao se referir a percussão como uma sonoridade menor, isto resultado de uma avaliação que esta associada com o menospreço que se tem com todo o ligado ao fato de que a percussão não define alturas reconhecidas dentro do sistema tonal mas mais que nada por que a percussão esta associada ao lado intuitivo e irracional em oposição ao saber "culto" ou acadêmico.
Demorou muito, por exemplo, para que seja incorporado no curriculum das academias o ensino de percussão, para sejam publicados métodos, transcrições para que o saber oral seja colocado na pauta.
A percussão ligada com a música de concerto sim mas o estudo da percussão popular e da bateria ainda não tem espaço para um estudo mais aprofundado a nível universitário em países como o Brasil.
Este desprezo envolve também uma aversão com todo o associado com a cultura negra, decorrente inclusive de uma ideia de superioridade racial ligada com o status social e também , em este caso, com aquilo que remete ao sentimento e ao corporal. sempre inserido e latente no conceito do que significa percutir bater, tocar,
Conclusão.
Temos que refletir que vivemos em uma cultura que esta dividida entre duas forças, uma que aceita e explora a musicalidade da percussão com todas suas possibilidades, cores e conteúdos, que ainda o coloca no lugar do sagrado e em confronto temos um outro lado que nega este saber, que sobre valoriza a musica tonal e a "razão" , produzindo uma dicotomia binária fundado em uma polaridade simplória que nega sem elaborar a multiplicidade de sons e de opções que nos oferece a música e a vida.
Vivemos entre estas duas forças, fica aqui para um debate posterior minhas considerações sobre a relação da cultura com a percussão.
Notas
(1) Fonte ‘Uma apresentação da epopéia de Gilgamesh”, Jose Trinidade Serra, fundação cultural do Estado de São Paulo – 1985.
(2) Na Antiguidade, o inferno foi entendido a partir de sua semântica, como o plano inferior, a terra dos mortos, e não no sentido cristão como o lugar onde se pagam os pecados.
A segunda observação que podemos fazer é que o tambor e a baqueta ficaram no “mundo dos mortos”, como conseqüência o som do tambor nos remete ao mundo subterrâneo, aquela imagem de repente nos serve como símbolo de uma sensação que produz a percussão e que nos brinda sensações realmente profundas , ligadas, inclusive ao mundo da morte e dos mistérios da vida, algo ancestral e sagrado que este poema de algum modo eternizou.
A segunda observação que podemos fazer é que o tambor e a baqueta ficaram no “mundo dos mortos”, como conseqüência o som do tambor nos remete ao mundo subterrâneo, aquela imagem de repente nos serve como símbolo de uma sensação que produz a percussão e que nos brinda sensações realmente profundas , ligadas, inclusive ao mundo da morte e dos mistérios da vida, algo ancestral e sagrado que este poema de algum modo eternizou.
(3)
Estamos nos referindo à religião afro-brasileira.
(4)
Músicos
do Candomblé
(5) citado do catedrático James Blades,
(6) Aqu uma citação do velho testamento onde se refere ao uso do pandeiro mais de 1700 anos AC. "Aconteció que cuando volvían ellos, cuando David volvió de matar al filisteo, salieron las mujeres de todas las ciudades de Israel cantando y danzando, para recibir al rey Saúl, con panderos, con cánticos de alegría y con instrumentos de música" (1 Samuel 18: 6)..
(6) Aqu uma citação do velho testamento onde se refere ao uso do pandeiro mais de 1700 anos AC. "Aconteció que cuando volvían ellos, cuando David volvió de matar al filisteo, salieron las mujeres de todas las ciudades de Israel cantando y danzando, para recibir al rey Saúl, con panderos, con cánticos de alegría y con instrumentos de música" (1 Samuel 18: 6)..
algo bien
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